Sem categoria Postado no dia: 5 março, 2024

Cônjuge infiel tem direito de receber pensão alimentícia?

  1. INTRODUÇÃO

No Brasil, uma das principais causas de divórcios e de dissolução de união estável é a infidelidade do cônjuge/ companheiro. A situação frustrante de verificar a traição do parceiro a quem foi dedicado, em alguns casos, anos da vida, pode ser intensificada com a ideia de, no fim da relação, o parceiro traidor ainda poder pleitear no Poder Judiciário alimentos, diante da dependência econômica que esse possuía para com o outro

Assim, a fim de analisar a presente situação, o artigo de hoje visa analisar o dever de alimentos do cônjuge e companheiro, bem como analisar se a infidelidade pode ser causa de exoneração de alimentos de um cônjuge/companheiro ao outro.

  1. O DIREITO DE ALIMENTOS DO EX CÔNJUGE/ EX COMPANHEIRO

Em regra, com o divórcio ou a dissolução da União estável, cessam todos os direitos e deveres recíprocos dos cônjuges/ companheiros, extinguindo os deveres conjugais de respeito, fidelidade, coabitação, cooperação e assistência, previstos no artigo 1672º do Código Civil

Por outro lado, há obrigações que mesmo com a extinção da relação permanecem aos ex conviventes. Uma dessas obrigações é o dever de prestar alimentos ainda que, em regra, de forma temporária ao ex -companheiro/ ex cônjuge, previsto no artigo 1.694 do Código Civil Brasileiro.

Esse dever advém do fato que o esforço conjunto no casamento ou na união estável possibilita que o casal atinja um determinado padrão de vida. Desse modo, em ocorrendo a dissolução do enlace, modifica-se a vida dos companheiros ou cônjuges, ocasionando, muitas vezes, na perda do padrão socioeconômico de modo repentino, prejudicando a sobrevivência do cônjuge/companheiro economicamente dependente.

Assim, o dever de alimentos encontra-se pautado nas obrigações no âmbito do direito das famílias decorrem do poder familiar e de seu parentesco, bem como no término do casamento ou da união estável (DIAS, 2009).

A fundamentação do dever de alimentos está no princípio da solidariedade e da mútua assistência entre os companheiros/cônjuges previsto no art 1.566,III do Código Civil ; da fonte da obrigação familiar alimentar e nos laços que os ligam. Ainda que cada uma das espécies da obrigação tenha sua origem diversa e suas características, todos estão no Código Civil de maneira indistinta (RODRIGUES, 2009).

A natureza indenizatória dos alimentos compensatórios. Devido a essa natureza indenizatória, aproxima-se do instituto da responsabilidade civil objetiva, pois é uma forma de reparação de um dano existente em virtude do rompimento do casamento ou da união estável sem observância da culpa. Apreciando essa configuração, existe dano e nexo causal, verificado em decorrência do prejuízo causado pelo desequilíbrio econômico e o rompimento de padrões anteriormente mantidos pelos cônjuges quando da ruptura do vínculo conjugal (DIAS, 2009).

Na natureza jurídica do instituto liga-se a origem de sua obrigação, como o dever assistencial recíproco e que se transforma em pensão alimentícia no momento de uma dissolução matrimonial, ou seja, está extremamente ligada à origem da obrigação.

No entanto, deve-se ressaltar que a despeito de proteger a dignidade humana do cônjuge dependente, a fixação de alimentos é medida excepcional que somente se legitima em circunstâncias especiais  a serem aferidas em caso concreto

Configurados o rompimento do vínculo conjugal e o desequilíbrio econômico-financeiro entre os antigos parceiros, existem outros fatores que merecem ser observados. Conforme Madaleno[1] (2013), o juiz irá ponderar uma série de situações fáticas. Uma delas será o acordo a que os cônjuges chegaram, pois poderão reconhecer o desequilíbrio econômico e ajustá-lo por meio de um acordo de alimentos compensatórios, restando ao juiz verificar se não é prejudicial para um dos cônjuges e homologá-lo. Verificará também a idade, o estado de saúde, a qualificação profissional e a possibilidade de acesso a um emprego. Além disso, será observada a dedicação à família e a colaboração com seu trabalho e com as atividades mercantis, industriais ou profissionais. Influencia, ainda, a duração do casamento e da sociedade conjugal, a eventual perda de um direito de pensão, a riqueza e os meios econômicos e as necessidades dos cônjuges, bem como qualquer circunstância que se entenda relevante.

Dessa forma, a dissolução do casamento não extingue a obrigação de prestar alimentos dos ex-cônjuges. A obrigação de pagar a pensão é condicionada a efetivamente estar comprovada a total incapacidade de um dos envolvidos não conseguir prover o próprio sustento, devendo o valor ser fixado de acordo com a na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.

Assim, verifica-se que a fixação de alimentos ao ex -cônjuge se baseia nos deveres estabelecidos aos cônjuges pelo artigo 1566 do Código Civil. Tal fato, porém pode gerar certas dúvidas como é o caso do cônjuge que, descumprindo o dever de fidelidade, previsto no artigo 1566,I do diploma legal mencionado, pleiteia no processo de divórcio/ dissolução a fixação de alimento em desfavor do cônjuge traído.

  1. CÔNJUGE TRAIDOR TEM DIREITO A RECEBER ALIMENTOS?

Há alguns anos, surgiu na internet notícia que veiculava a seguinte reportagem em diversos canais da mídia:” O infiel não tem direito à pensão alimentícia, reconhece o STJ”.

No entanto, a realidade do julgado(AgResp 1.269.166), difere do que tais meios, por serem provavelmente desconhecedores do direito, veicularam. No caso em concreto mencionado o Superior Tribunal de Justiça em verdade não adentrou no mérito da questão, uma vez que a relatora, Ministra Isabel Gallotti, apenas analisou aspectos formais do recurso especial, entendendo haver óbice processual para levá-lo a julgamento pelo colegiado.

O caso em concreto chegou na Corte Superior em razão de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), que entendeu que a infidelidade virtual praticada pela esposa configurou comportamento indigno hábil a afastar o direito de receber alimentos do ex-marido.

A indignidade, elemento do Direito Civil previsto de  forma genérica no parágrafo único do artigo 1708 do Código Civil, não apresenta rol taxativo de condutas que a configure. Assim, não há unanimidade entre doutrina e jurisprudência acerca da exaustividade desse rol, ampliando ainda mais as discussões a respeito.

Art. 1.708. Com o casamento, a união estável ou o concubinato do credor, cessa o dever de prestar alimentos.

Parágrafo único. Com relação ao credor cessa, também, o direito a alimentos, se tiver procedimento indigno em relação ao devedor.

Deve-se destacar na temática a existência do Enunciado 264 da III Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal (CNJ), o qual prevê que as mesmas hipóteses de indignidade que afastam a herança devem ser aplicadas para afastar os alimentos. Percebe-se, todavia, uma tendência dos tribunais em aplicar o rol de forma taxativa para fins sucessórios ao passo que, nos casos de extinção da obrigação alimentar, admitem um conceito aberto de indignidade a partir do caso concreto.

Assim, cumpre a parte interessada a comprovação de situação extrema que justifique a impossibilidade de prestar alimentos ao cônjuge, bem como o fato de que a indignidade que autoriza a cassação do dever alimentar, nesse passo, deveria ser a decorrente de conduta fora dos limites matrimoniais, após a fixação da obrigação e não ligada à persecução da arcaica – e totalmente em desuso – culpa for infração a dever conjugal (v.g. é indigna a prática ou tentativa de crime doloso contra a vida do alimentante ou de seus familiares).

Já as práticas de atos ofensivos aos deveres matrimoniais – caso superada sua injuridicidade ante a Emenda Constitucional 66/2010 – geram efeitos na seara dos alimentos pela égide dos artigos 1.702 e 1704, caput e parágrafo único, do Código Civil, segundo os quais o dever alimentar limitar-se-ia ao “valor indispensável à sobrevivência”.:

Art. 1.702. Na separação judicial litigiosa, sendo um dos cônjuges inocente e desprovido de recursos, prestar-lhe-á o outro a pensão alimentícia que o juiz fixar, obedecidos os critérios estabelecidos no art. 1.694.

(…)

Art. 1.704. Se um dos cônjuges separados judicialmente vier a necessitar de alimentos, será o outro obrigado a prestá-los mediante pensão a ser fixada pelo juiz, caso não tenha sido declarado culpado na ação de separação judicial.

Parágrafo único. Se o cônjuge declarado culpado vier a necessitar de alimentos, e não tiver parentes em condições de prestá-los, nem aptidão para o trabalho, o outro cônjuge será obrigado a assegurá-los, fixando o juiz o valor indispensável à sobrevivência.

No entanto, por outro lado, a indignidade do cônjuge traidor poderia ser reconhecida diante da análise concreto por meio do crime de injúria tipificado no Código Penal como sendo uma pessoa profere a outra um xingamento ou ato, contendo algo desonroso ou ofensivo, atingindo a sua dignidade, honra e moral. Esse caso de indignidade encontra-se previsto tanto no artigo 557,III do Código Civil, bem como do artigo 1.814,II do Código Civil.

Assim, é importante que entre em contato com advogado de sua confiança para a análise do caso concreto e da possibilidade de concessão ou não do pedido de alimentos do/ao cônjuge/companheiro

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[1] MADALENO, R. Curso de Direito de Família. 5. Ed. Rio De Janeiro: Forense, 2013.