Artigos Postado no dia: 30 julho, 2024

ESTOU INADIMPLENTE COM O CONDOMÍNIO. POSSO USAR AS ÁREAS COMUNS DELE?

  1. INTRODUÇÃO 

Normalmente, aqueles condomínios sem assessoria jurídica especializada tendem a realizar certas atitudes para sancionar condôminos inadimplentes e acabam por praticar atos ilícitos de acordo com nossa legislação. 

Uma dessas atitudes consideradas equivocadas consiste na proibição pelo condomínio da utilização das áreas comuns como piscinas e clubes. 

No artigo de hoje, analisaremos recente julgado do Tribunal de Minas Gerais e o que a legislação e jurisprudência nacional regula o tema. 

  • O CONDÔMINO INADIMPLENTE PODE SER PROIBIDO DE UTILIZAR AS ÁREAS COMUNS?

A resposta para essa pergunta é NÃO! 

O condomínio, ainda que tenha expressamente previsto em sua convenção tal possibilidade, não pode proibir, em razão da inadimplência, qualquer condômino ou familiar desse condômino de utilizar as áreas comuns do condomínio. Tal direito decorre do fato de que, por lei, a unidade imobiliária abrange não apenas uma fração ideal no solo, mas também as outras partes comuns. 

Nesse sentido temos a previsão do artigo 1331,§3º que prevê: 

Art. 1.331. Pode haver, em edificações, partes que são propriedade exclusiva, e partes que são propriedade comum dos condôminos.

(…)

  • 3 o A cada unidade imobiliária caberá, como parte inseparável, uma fração ideal no solo e nas outras partes comuns, que será identificada em forma decimal ou ordinária no instrumento de instituição do condomínio

 Verifica-se, portanto, que a propriedade imobiliária abrange a correspondente fração ideal de todas as partes comuns. Com efeito, o proprietário do apartamento é considerado dono das áreas comuns do condomínio, com isso, a sua proibição de acessar a partes comuns estaria limitando o seu direito de propriedade.

Deve-se ressaltar que não se trata de impunidade ao condômino inadimplente, uma vez que existem outras formas de punição. Entre as possibilidade existentes, verifica-se a previsão do artigo 1.336, § 1º do Código Civil:

Art 1336 (…) § 1 o O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o débito.

  • 2 o O condômino, que não cumprir qualquer dos deveres estabelecidos nos incisos II a IV, pagará a multa prevista no ato constitutivo ou na convenção, não podendo ela ser superior a cinco vezes o valor de suas contribuições mensais, independentemente das perdas e danos que se apurarem; não havendo disposição expressa, caberá à assembleia geral, por dois terços no mínimo dos condôminos restantes, deliberar sobre a cobrança da multa.

Ainda, se o condômino reiteradamente apresentar um comportamento faltoso, será possível impor a ele outras penalidades, também de caráter pecuniário, nos termos do art. 1.337:

 

    Art. 1.337. O condômino, ou possuidor, que não cumpre reiteradamente com os seus deveres perante o condomínio poderá, por deliberação de três quartos dos condôminos restantes, ser constrangido a pagar multa correspondente até ao quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, conforme a gravidade das faltas e a reiteração, independentemente das perdas e danos que se apurem. Parágrafo único. O condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento anti-social, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, até ulterior deliberação da assembleia.

 

Nesta esteira, a lei autoriza meios coercitivos e idôneos à satisfação do crédito, descabendo ao condomínio valer-se de sanções outras que não as pecuniárias expressa e taxativamente previstas no Código Civil para o específico caso de inadimplemento das despesas condominiais.

Em outras palavras, não existe margem discricionária para a imposição de outras sanções que não sejam as pecuniárias estipuladas na Lei. Observe o julgado que reflete tal argumento:

 

    RECURSO ESPECIAL. DIREITO CONDOMINIAL. DEVEDOR DE COTAS CONDOMINIAIS ORDINÁRIAS E EXTRAORDINÁRIAS. CONDÔMINO NOCIVO OU ANTISSOCIAL. APLICAÇÃO DAS SANÇÕES PREVISTAS NOS ARTS. 1336, § 1º, E 1.337, CAPUT, DO CÓDIGO CIVIL. POSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE CONDUTA REITERADA E CONTUMAZ QUANTO AO INADIMPLEMENTO DOS DÉBITOS CONDOMINIAIS. INEXISTÊNCIA DE BIS IN IDEM. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. De acordo com o art. 1.336, § 1º, do Código Civil, o condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de 1% (um por cento) ao mês e multa de até 2% (dois por cento) sobre o débito. 2. O condômino que deixar de adimplir reiteradamente a importância devida a título de cotas condominiais poderá, desde que aprovada a sanção em assembleia por deliberação de 3/4 (três quartos) dos condôminos, ser obrigado a pagar multa em até o quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, conforme a gravidade da falta e a sua reiteração. 3. A aplicação da sanção com base no art. 1.337, caput, do Código Civil exige que o condômino seja devedor reiterado e contumaz em relação ao pagamento dos débitos condominiais, não bastando o simples inadimplemento involuntário de alguns débitos. 4. A multa prevista no § 1º do art. 1.336 do CC/2002 detém natureza jurídica moratória, enquanto a penalidade pecuniária regulada pelo art. 1.337 tem caráter sancionatório, uma vez que, se for o caso, o condomínio pode exigir inclusive a apuração das perdas e danos. (…) (STJ. 4ª Turma. REsp 1247020/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 15/10/2015)

 

Neste sentido, o TJDFT expediu o seguinte:

 

    CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO ANULATÓRIA CUMULADA COM OBRIGAÇÃO DE FAZER E INDENIZAÇÃO DE DANOS MORAIS. CONDOMÍNIO. RESTRIÇÃO DE USO DAS ÁREAS COMUNS DE LAZER. CONDÔMINO INADIMPLENTE. ASSEMBLÉIA CONDOMINIAL OU REGIMENTO INTERNO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO EXPRESSA NA CONVENÇÃO OU REGIMENTO DO CONDOMÍNIO. PRETENSÃO ANULATÓRIA. DIREITO. SUPORTE MATERIAL. AUSÊNCIA. ÔNUS PROBATÓRIO. DISTRIBUIÇÃO. IMPUTAÇÃO AO AUTOR (CPC, ART. 333, I). PRETENSÃO COMINATÓRIA. PROIBIÇÃO DE ACESSO À ÁREA DE LAZER. CONDUTA ARBITRÁRIA E IRREGULAR. DIREITO DE PROPRIEDADE. PREVALÊNCIA. DANO MORAL. ATO ILÍCITO. INEXISTÊNCIA. PRETENSÃO INDENIZATÓRIA. REJEIÇÃO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORM ADA (…) 3. O mero inadimplemento de taxas condominiais não autoriza, por si só, a suspensão/restrição do condômino ao uso de serviços essenciais e nem ao acesso às áreas comuns de lazer, pois implicam violação ao direito de propriedade e à dignidade da pessoa humana e o exercício arbitrário das próprias razões mediante uso de instrumentos de coerção e humilhação como forma de cobrança, pois, no estado de direito, ao credor subsistem os mecanismos disponíveis no ordenamento jurídico para recuperação de créditos inadimplidos, tornando ilegal e ilegítimo que o condomínio se valha de medidas arbitrárias, constrangedoras e limitadoras ao direito de propriedade em face do morador em atraso com as contribuições condominiais. (Acórdão n.922944, 20140710175774APC, Relator: TEÓFILO CAETANO, Revisor: SIMONE LUCINDO, 1ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 24/02/2016, Publicado no DJE: 09/03/2016)

Assim, o regimento interno de um condomínio não poderá determinar que o condômino inadimplente fique proibido de utilizar as áreas comuns do condomínio. Tal situação implica violação ao direito de propriedade e à dignidade da pessoa humana.

         2. CASO CONCRETO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS 

Para fundamentar a presente discussão, cita-se recente julgado da 20ª Câmara Cível do TJ/MG manteve a decisão da comarca de Nova Lima/MG que assegurou a um proprietário de lotes em um condomínio o direito de acesso ao clube do empreendimento, mesmo estando inadimplente com as taxas condominiais. O proprietário havia ingressado com uma ação judicial buscando tutela antecipada para garantir que sua família pudesse utilizar as dependências do espaço de lazer.

O juiz da comarca de Nova Lima- MG acolheu as alegações do condômino, determinando a liberação de acesso às instalações do clube do condomínio. 

Em sede recursal, o condomínio alegou que a restrição imposta não se aplicava às áreas comuns de lazer do condomínio, cujo acesso é irrestrito ao autor, mas apenas à sede esportiva e social do clube. Argumentou ainda que o morador era devedor contumaz e que a restrição de uso das áreas do clube não configurava violação à sua dignidade.

 No entanto, a Câmara  do Tribunal de Justiça seguiu o voto do relator e entendeu que condomínio possui meios legais para cobrar as taxas condominiais em atraso, sem que seja necessário restringir o acesso dos moradores às áreas comuns. O desembargador ponderou que, considerando os diversos instrumentos de cobrança e garantia previstos no ordenamento jurídico, não há justificativa legítima para que o condomínio os ignore.

Ainda na decisão foi utililzada para a sua fundamentação decisão do Superior Tribunal de Justiça que defende a infração ao princípio da dignidade humana a atitude do condomínio de proibir a utilização do condômino e seus familiares das áreas comuns, uma vez que expõe ostensivamente inadimplencika perante o meio social em que residem. 

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