
1)INTRODUÇÃO
O presente artigo visa responder sobre a possibilidade da coexistência da mudança para o exterior da criança e a permanência da guarda compartilhada entre os genitores, uma vez que no dia a dia tais institutos parecem impossíveis de existir em harmonia.
Assim, para o melhor entendimento, iremos analisar o que consistiria a guarda compartilhada, a possibilidade da mudança para exterior com o menor e a análise da possibilidade da coexistência de tais elementos.
2) Guarda compartilhada
A guarda compartilhada do(s) filhos vem disciplinada no Código Civil 2002, em seu artigo 1.583,§ 1º, o qual apresenta a seguinte redação:
“Artigo 1583 (…)
- 1º Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5 o) e, por guarda compartilhada, a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns. (Incluído pela Lei n.º 11.698, de 2008)…
Assim, verifica-se que a guarda compartilhada consiste em modalidade de guarda em que os pais participam ativamente da vida dos filhos, já que ambos detêm a guarda legal dos mesmos, repartindo valores e despesas com o menor.
Para a realização do exercício eficaz dessa guarda necessita de dois elementos básicos: os genitores devem estar aptos para o exercício da guarda, ou seja, tenham capacidade legal e moral para colaborar na criação e educação dos filhos e devem manter um bom relacionamento
Conforme a autora Maria Berenice Dias[1] essa modalidade deve ser estimulada inclusive pelo Poder Judiciário, eis que atende aos melhores interesses da criança, devendo apenas observar sempre à situação familiar no intuito de verificar qual situação se amolda melhor à criança.
No sistema jurídico brasileiro a guarda compartilhada apresenta duas especias: a guarda compartilhada legal/jurídica e a guarda material/física. A primeira consiste no efetiva responsabilidade e possibilidade de escolha da forma de educar e criar os filhos, sendo elemento do poder familiar; já a segunda pode ser definida como o compartilhamento da mesma residência com a criança e ao adolescente.
Verifica-se, portanto, a existência de duas formas de exercer a guarda compartilhada sobre o(s) menor(es).
A guarda compartilhada não pode ser usada como exceção, e sim como regra, já que ela é mais benéfica aos filhos, por meio dela fica assegurada a convivência em família, a proteção integral da criança e do adolescente; ela deve ser concedida mesmo que não haja acordo entre os pais, assegurando assim o direito do filho a conviver com ambos e, por conseguinte, atendendo ao melhor interesse da criança/adolescente.
3) Possibilidade de mudança com o menor
Outro ponto que deve-se analisar é com relação à possibilidade de mudança por apenas um dos genitores com a criança para o exterior.
No final da relação conjugal, é comum que os envolvidos desejem recomeçar a vida em outros locais, inclusive em outros países, o que muitas vezes atrapalha a convivência do menor com o outro genitor que permaneceu no país de origem.
Ante a esta informação, é preciso estar atento as questões legais acerca da mudança de domicílio nas situações que envolvem pais separados e filhos menores, vez que o poder familiar e a convivência devem ser realizados por ambos genitores e qualquer tentativa de afastar um dos pais do convívio da criança, inclusive com a justificativa de uma mudança para outro país, pode ensejar em uma Ação de Alienação Parental, conforme previsto no artigo 2º, Parágrafo único, VII, da lei de alienação parental:
Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros: mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós.
No entanto, deve-se ressaltar que a mudança de país é plenamente cabível desde que acordada entre os genitores ou autorizada pelo Poder Judiciário, cabendo ao genitor que irá mudar informar a alteração de localidade.
Na melhor das hipóteses, essa conversa deve dar fim ao assunto por meio de um consenso entre os pais. É indicado que a mudança seja informada no processo com a mediação de um advogado. O advogado irá reduzir a termo as questões relacionadas à mudança e juntar o documento no processo que trata das questões relacionadas à guarda e convivência da criança.
Não havendo consenso entre os pais, deverá ser proposta ação competente para ser suprida a ausência da autorização de viagem e moradia ao exterior. Nessa ação o genitor que irá residir em outro país com o filho deve comprovar a razão da mudança e dar garantias que a criança terá proteção integral na nova morada. O juiz irá analisar as provas e, dependendo do caso concreto, poderá decidir de forma liminar o pedido.
Assim, verifica-se que a mudança para o exterior com o filho menor é plenamente possível, ainda que sem a autorização do genitor que permanecerá no Brasil, desde que se respeite o exercício do poder familiar e a convivência do menor com o outro genitor.
4) É POSSÍVEL ENTÃO GUARDA COMPARTILHADA COM A MUDANÇA DO MENOR AO EXTERIOR?
Analisados, portanto, os conceitos e elementos da guarda compartilhada e os da mudança de domicílio do menor para outro país com um dos genitores, observa-se que é possível coadunar os dois elementos.
Nesse sentido, a terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ restabeleceu sentença de juiz de 1ª instância que autorizou a mudança de uma criança para a Holanda, em companhia da mãe, fixando, na mesma decisão, regime de guarda compartilhada e definindo parâmetros de convivência em favor do pai, que reside no Brasil.
A referida sentença havia sido reformada elo tribunal de Justiça que afirmou a incompatibilidade da mudança com a visitação do genitor.
No entanto, ao ser analisado pelo STJ, considerou-se que a guarda compartilhada não exige custódia física da criança, o que permite que o regime seja fixado mesmo quando os pais moram em países diferentes. Essa flexibilidade, no entanto, não afasta a possibilidade de convivência da criança com ambos os genitores e a divisão de responsabilidades.
De acordo com a Ministra relatora, Nancy Andrighi, a guarda compartilhada não pode se confundir com o regime de guarda alternada, na qual “há a fixação de duas residências, de modo que a prole residirá com cada um dos genitores por determinado período, ocasião em que cada um deles, individual e exclusivamente, exercerá a guarda dos filhos”.[2]
Apesar da flexibilidade proporcionada pela guarda compartilhada, a ministra reconheceu que a alteração do lar de referência da criança para outro país vai provocar modificação substancial nas relações familiares e deve gerar dificuldades de adaptação na rotina e no modo de convivência das pessoas envolvidas.
Assim, plenamente cabível a união de guarda compartilhada com a mudança da criança com um dos genitores para o estrangeiro.
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